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STF determina a suspensão das ações sobre Pejotização no Brasil: o que você precisa saber
No dia 14 de abril de 2025, o Supremo Tribunal Federal (STF), por decisão do ministro Gilmar Mendes, determinou a suspensão de todos os processos judiciais em tramitação no Brasil que tratam da licitude da chamada “pejotização”.
Essa prática, cada vez mais comum no mercado de trabalho, consiste na contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas (PJ) em vez de empregados com carteira assinada, o que exime as empresas de arcar com encargos trabalhistas e previdenciários.
A decisão do STF reacende o debate sobre a legalidade dessa modalidade de contratação, suas consequências para os trabalhadores e a necessidade de harmonização da jurisprudência nacional.
1. O que é Pejotização?
A pejotização deriva da expressão “pessoa jurídica” e refere-se à prática em que empresas contratam profissionais para prestar serviços como se fossem empresas individuais, geralmente por meio da constituição de uma pessoa jurídica, como uma microempresa ou empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI).
Nesse modelo, o trabalhador emite notas fiscais pelos serviços prestados e assume a responsabilidade pelo pagamento de impostos e contribuições previdenciárias, enquanto a empresa contratante não reconhece vínculo empregatício, evitando obrigações como pagamento de 13º salário, férias, FGTS e contribuição ao INSS.
Embora a pejotização possa ser vantajosa em alguns casos, como para profissionais autônomos com alta especialização que desejam maior flexibilidade, ela tem sido amplamente questionada quando utilizada para mascarar relações de trabalho subordinado.
A Consolidação das Leis do Trabalho ( CLT), em seu artigo 3º, define o empregado como aquele que presta serviços de forma pessoal, habitual, subordinada e remunerada. Quando esses elementos estão presentes, mesmo em contratos de PJ, a Justiça do Trabalho frequentemente reconhece o vínculo empregatício, o que gera litígios entre empresas e trabalhadores.
2. Contexto da Decisão do STF
A decisão do ministro Gilmar Mendes foi proferida no âmbito de uma reclamação constitucional ( Rcl 65.412), ajuizada contra decisões da Justiça do Trabalho que consideravam ilícita a pejotização em casos específicos.
O ministro entendeu que o STF, em julgamentos anteriores, já reconheceu a possibilidade de contratação via pessoa jurídica sem configurar vínculo empregatício, desde que respeitados os limites legais e constitucionais. Ele destacou que a multiplicidade de decisões conflitantes na Justiça do Trabalho cria insegurança jurídica, justificando a suspensão nacional dos processos até que o STF estabeleça uma tese definitiva sobre o tema.
Essa suspensão tem caráter temporário e visa uniformizar a interpretação jurídica sobre a pejotização, especialmente em um cenário de transformações no mercado de trabalho impulsionadas pela economia digital, pela flexibilização das relações laborais e pela Reforma Trabalhista de 2017 (Lei nº 13.467/2017). A decisão não impede a continuidade de negociações contratuais, mas paralisa ações judiciais que discutem a validade da pejotização, incluindo aquelas em fase de execução.
3. Possíveis implicações jurídicas
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender os processos que discutem a pejotização traz consequências profundas tanto no campo jurídico quanto no cenário social e econômico do Brasil. No âmbito do Direito, a medida busca harmonizar interpretações sobre a licitude dessa prática, mas, enquanto o STF não define uma tese definitiva, cria um cenário de incerteza. Trabalhadores que aguardam o reconhecimento de direitos trabalhistas podem enfrentar atrasos na resolução de seus casos, enquanto empresas ficam sem clareza para estruturar suas contratações. Esse limbo jurídico, embora temporário, reflete a dificuldade de equilibrar a flexibilização das relações de trabalho com a proteção dos direitos fundamentais.
O STF já sinalizou, em decisões anteriores, uma visão mais aberta à modernização do mercado de trabalho. Em casos como a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324 e o Recurso Extraordinário (RE) 958.252, a Corte validou a terceirização de atividades-fim e reconheceu que contratos sem vínculo empregatício podem ser legítimos, desde que respeitados os limites legais. A suspensão determinada pelo ministro Gilmar Mendes parece reforçar essa tendência, sugerindo que o STF pode optar por uma interpretação que alinhe o Direito às transformações econômicas e tecnológicas. Contudo, essa abordagem entra em tensão com a Justiça do Trabalho, que tradicionalmente protege os empregados e costuma identificar vínculo empregatício em contratos de pessoa jurídica considerados fraudulentos. A centralização da decisão no STF pode ser vista como uma tentativa de limitar a autonomia dos juízes trabalhistas, o que reacende debates sobre o papel de cada instância no sistema judiciário.
Além disso, a suspensão dialoga diretamente com a Reforma Trabalhista de 2017, que ampliou as possibilidades de contratações flexíveis, como o trabalho intermitente e a terceirização irrestrita. O desfecho do STF pode consolidar essa flexibilização, mas também traz à tona a necessidade de discutir como conciliar liberdade econômica com garantias trabalhistas. Fora do campo jurídico, a pejotização impacta a sociedade de forma significativa. Quando usada de maneira indiscriminada, essa prática pode precarizar o trabalho, privando trabalhadores de direitos como férias, 13º salário e aposentadoria. Isso é especialmente preocupante para profissionais de baixa renda, que muitas vezes aceitam contratos de PJ por falta de alternativas. A disseminação da pejotização também pressiona a Previdência Social, já que trabalhadores contratados como pessoas jurídicas contribuem de forma diferente dos empregados celetistas, o que pode comprometer a sustentabilidade do sistema no futuro.
A economia digital, com plataformas como Uber e iFood, intensificou o uso de contratações via PJ, especialmente em setores como tecnologia e saúde. A decisão do STF poderá redefinir como essas empresas operam, influenciando o mercado de trabalho como um todo. No entanto, a ausência de proteção trabalhista para muitos “pejotas” tende a agravar a desigualdade social, já que profissionais de alta renda conseguem negociar contratos mais vantajosos, enquanto trabalhadores menos qualificados ficam vulneráveis. Olhando para o futuro, o STF enfrenta o desafio de encontrar um equilíbrio delicado. Definir critérios claros para distinguir a pejotização lícita da fraudulenta, como a ausência de subordinação, será essencial. Além disso, o diálogo com sindicatos, empresas e a sociedade civil pode garantir que a decisão final considere o impacto social da prática. Por fim, o Congresso Nacional pode ser chamado a atualizar a legislação trabalhista, criando regras que protejam os trabalhadores sem engessar a economia, promovendo um mercado de trabalho mais justo e sustentável.
A decisão do ministro Gilmar Mendes de suspender as ações sobre pejotização reflete a complexidade das relações de trabalho no Brasil contemporâneo. Ao buscar uniformizar a jurisprudência, o STF reconhece a necessidade de adaptar o direito às transformações econômicas, mas também enfrenta o desafio de preservar os direitos fundamentais dos trabalhadores. Enquanto a Corte não define uma tese vinculante, trabalhadores, empresas e advogados devem acompanhar de perto os desdobramentos, pois o precedente a ser estabelecido terá impactos profundos no mercado de trabalho e na sociedade como um todo.
A pejotização, quando legítima, pode ser uma ferramenta de flexibilização e inovação. No entanto, sua utilização para burlar direitos trabalhistas exige uma resposta firme do Judiciário e do Legislativo. O debate está apenas começando, e cabe a todos os atores envolvidos contribuir para um modelo de trabalho que concilie eficiência econômica com justiça social.
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Fonte: Jusbrasil