A reforma tributária brasileira, formalizada pela Emenda Constitucional nº 132 de 20 de dezembro de 2023, representa uma transformação significativa no sistema fiscal do país. Seu objetivo é simplificar a tributação, unificar impostos e promover uma distribuição mais justa da arrecadação entre estados e municípios. Um dos aspectos mais impactantes dessa reforma é a mudança no regime jurídico dos benefícios fiscais, que afeta diretamente empresas, governos locais e o desenvolvimento regional.

Antes da reforma, o sistema tributário brasileiro era marcado por complexidade e competição. Estados e municípios frequentemente ofereciam isenções e reduções de impostos, como o ICMS, para atrair investimentos, prática conhecida como “guerra fiscal”. Embora isso pudesse beneficiar empresas em curto prazo, gerava perdas de arrecadação e desigualdades regionais.

A reforma introduz dois novos tributos: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que substitui o ICMS e o ISS, e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que substitui o PIS e a COFINS. O IPI será extinto gradualmente até 2032, exceto para a Zona Franca de Manaus. O IBS será cobrado no local de consumo, e não na produção, eliminando incentivos para manipular a tributação entre estados.

Uma das mudanças mais significativas é a proibição de novos benefícios fiscais pelos estados e municípios para o IBS, conforme estabelecido no artigo 156-A, §1, X, da Constituição Federal. Isso significa que governos locais não poderão mais criar isenções ou reduções para atrair empresas, centralizando a regulamentação dos incentivos. Se, de um lado, a medida visa uniformizar a tributação e reduzir a competição desleal, de outro levanta preocupações sobre o impacto em regiões que dependiam desses benefícios para atrair investimentos.

Apesar da proibição, a reforma prevê exceções para setores estratégicos e de interesse social. O artigo 225, §1, VIII, por exemplo, garante um regime fiscal favorecido para biocombustíveis e hidrogênio de baixa emissão, com tributação menor que a de combustíveis fósseis. Isso inclui contribuições como PIS/COFINS e impostos como o IBS, incentivando a transição para energias renováveis. Da mesma forma, o artigo 156-A, §5, V permite benefícios para bens de capital, como crédito integral ou redução de alíquotas, para estimular investimentos em infraestrutura. Setores como educação, saúde, medicamentos e transporte público também terão regimes diferenciados, conforme o artigo 9º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), com regras uniformes nacionalmente e revisões a cada cinco anos.

Outro destaque é o tratamento dado à indústria automotiva. O artigo 19 do ADCT concede benefícios fiscais transitórios para projetos de produção de veículos elétricos e movidos a biocombustíveis, aprovados até 31 de dezembro de 2024 ou novos projetos até 31 de dezembro de 2025. Esses benefícios, como créditos presumidos, serão reduzidos em 20% ao ano a partir de 2029, encerrando-se em 2032. Essa medida busca apoiar a inovação no setor, mas exige que as empresas planejem a transição para um cenário sem incentivos.

Para suavizar os impactos da extinção dos benefícios fiscais existentes, a reforma criou mecanismos de compensação. O Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais, previsto no artigo 125, §3, do ADCT, será financiado com parte da arrecadação do IBS a partir de 2026 e funcionará até 31 de dezembro de 2032. Ele apoiará estados e municípios que perderem receita com o fim dos incentivos. Além disso, o artigo 128, §1, do ADCT determina que os benefícios concedidos até 31 de maio de 2023 serão reduzidos gradualmente: em 2029, serão 90% do valor original; em 2030, 80%; em 2031, 70%; e em 2032, 60%. Após 2032, créditos remanescentes de ICMS poderão ser compensados com o IBS ou parcelados em até 240 meses.

A reforma também introduz o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR), conforme o artigo 159-A da Constituição, para reduzir desigualdades regionais. Financiado pela União, o FNDR distribui recursos com base na população (30%) e coeficientes de participação (70%), oferecendo uma alternativa aos incentivos fiscais para promover o desenvolvimento de regiões menos favorecidas. No entanto, a efetividade desse fundo dependerá de sua gestão, o que ainda gera incertezas.

Para empresas, as mudanças trazem desafios e oportunidades. A proibição de novos benefícios fiscais pode dificultar a atração de investimentos em algumas regiões, exigindo que estados e municípios invistam em infraestrutura e qualidade de vida para se manterem competitivos. Por outro lado, a uniformização da tributação cria um ambiente mais previsível, reduzindo custos de conformidade e litígios. Setores como energia renovável e saúde, que mantêm incentivos, podem se consolidar, enquanto indústrias que dependiam de benefícios precisarão buscar novas formas de competitividade, como inovação e eficiência.

Regiões menos desenvolvidas, que usavam incentivos fiscais para atrair empresas, podem se beneficiar do FNDR, mas a transição será desafiadora. A criação de regimes diferenciados para micro e pequenas empresas, conforme o artigo 146, III, d, também oferece alívio, com tratamentos simplificados para reduzir a carga tributária.

A implementação da reforma será gradual, com a CBS começando em 2027 e o IBS em 2029, completando a cobrança no destino até 2078. Essa transição longa permite que empresas e governos se adaptem, mas exige planejamento estratégico. A simplificação tributária pode melhorar a competitividade do Brasil no cenário internacional, mas o sucesso dependerá da regulamentação complementar e da execução dos fundos criados.

Em resumo, a reforma tributária altera profundamente o regime jurídico dos benefícios fiscais, limitando a autonomia de estados e municípios, mas mantendo incentivos para setores estratégicos. A transição gradual, com fundos de compensação e desenvolvimento, busca mitigar impactos, mas os desafios regionais e setoriais exigem atenção. Para empresários, a reforma oferece um sistema mais simples e previsível, mas também requer adaptação a um novo cenário fiscal.

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